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sábado, 13 de fevereiro de 2021

Legislação comentada - artigos 304/310 do CPP - prisão em flagrante

Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.

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§ 1o Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.

§ 2o A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.

§ 3o Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste.

Art. 305. Na falta ou no impedimento do escrivão, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal.

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

§ 2o No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.

Art. 307. Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto.

Art. 308. Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo.

Art. 309. Se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante.

Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:

I - relaxar a prisão ilegal; ou

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

Procedimento da prisão em flagrante: muitos imaginam que a prisão em flagrante é composta somente por dois atos: a “voz de prisão”, momento em que a autoridade ou qualquer do povo afirma que a pessoa está presa e realiza a sua captura, e o posterior encaminhamento à autoridade (geralmente, o delegado). Contudo, a prisão em flagrante é composta por uma série de atos que, quando não observada, pode torná-la ilegal – e, sendo ilegal a prisão, deverá ocorrer o seu relaxamento, que tem como consequência a soltura de quem foi preso, sem prejuízo da responsabilização funcional e criminal da autoridade responsável pelo ato, em caso de abuso. Para que o tema fique claro, vejamos, de forma resumida, o passo a passo da prisão em flagrante: 1o ato: a captura do agente: as hipóteses de flagrante delito estão no art. 302 do CPP. Caso alguém se encontre em qualquer daquelas situações, poderá ocorrer a sua prisão em flagrante, que pode se dar pelas autoridades policiais, por seus agentes ou por qualquer do povo (veja os comentários ao art. 301). É importante lembrar que o preso tem o direito de saber quem está realizando a sua prisão (art. 5oLXIV da CF). Quanto às algemas, deve-se observar o que dispõe a Súmula Vinculante n. 11. Ademais, o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado (art. 5oLXIII da CF); 2o ato: condução coercitiva à presença da autoridade: o art. 304 não fala em “autoridade policial”, mas em “autoridade competente”. Sobre o tema, transcrevo as lições de Nucci (CPP Comentado, p. 639): "é, como regra, a autoridade policial. Pode ser, também, o juiz de direito (art. 307, parte final). Acrescente-se, ainda, a possibilidade de o auto ser lavrado por deputado ou senador. A respeito, consulte-se a Súmula 397 do STF". Apresentado o preso à autoridade, serão realizados os seguintes atos: a) comunicação: segundo o art. 306, “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”; b) oitiva do condutor: aquele que levou o preso até a presença da autoridade será ouvido, sendo suas declarações reduzidas a termo, colhida a assinatura, e a ele será entregue cópia do termo e recibo de entrega do preso. O recibo tem como objetivo desonerar o condutor, a partir daquele momento, de qualquer evento posterior que venha a ocorrer em relação à prisão ou ao preso. O condutor pode ser particular, pois a prisão em flagrante pode ser feita por qualquer do povo (art. 301). Ademais, não é preciso que tenha presenciado o fato; c) oitiva das testemunhas: devem ser ouvidas as testemunhas que acompanharam o condutor do preso à autoridade competente. Como a lei fala em “testemunhas”, no plural (art. 304 do CPP), há o entendimento de que devem ser, no mínimo, duas. Nada impede que policiais sirvam como testemunhas para a lavratura do auto. Até mesmo quando não houver testemunhas é possível a lavratura do auto; d) oitiva da vítima: ainda que o art. 304 não a mencione, é inegável a importância de suas declarações. Nos crimes de ação penal privada ou de ação penal pública condicionada à representação, a oitiva do ofendido é essencial à lavratura do auto de prisão em flagrante; e) interrogatório do acusado: para alguns autores, não é correto se falar em “interrogatório”, pois ainda não existe imputação ou processo, tampouco em “acusado”, afinal, ainda não há qualquer acusação. Trata-se, por ora, de pessoa conduzida à autoridade policial para o esclarecimento dos fatos – não é impossível que tudo não passe, por exemplo, de um mal-entendido. O preso tem o direito de permanecer em silêncio (art. 5oLXIII da CF). Quanto ao preso impossibilitado de ser ouvido (por exemplo, hospitalizado), evidentemente que a sua oitiva será deixada para momento posterior, não se falando em ilegalidade do APF em razão disso; 3o ato: a lavratura do auto de prisão em flagrante: convencida a autoridade de que a prisão em flagrante foi legal, o escrivão lavrará o auto. Caso ele esteja impedido, ou em sua falta, qualquer pessoa designada pela autoridade o lavrará, depois de prestado o compromisso legal; 4o ato: encarceramento do preso: nas hipóteses em que não for possível a soltura. Veremos o assunto ao longo deste material; 5o ato: encaminhamento do auto de prisão em flagrante: em até vinte e quatro horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. No mesmo prazo, ser-lhe-á entregue a denominada “nota de culpa” (art. 306, parágrafo primeiro).

Prisão por delegação: “Não deve ser admitida, em hipótese alguma, a transferência do preso pelo condutor a terceiro, que não tomou parte na detenção, sendo vedada a chamada prisão por delegação. Somente o condutor, qualquer que seja, policial ou não, pode fazer a apresentação. Evidentemente, se o policial atendeu à ocorrência e ajudou a efetuar a prisão, pode ele assumir a condição de condutor.” (CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, p. 323).

Não lavratura do APF: “O auto somente não será lavrado se o fato for manifestamente atípico, insignificante ou se estiver presente, com clarividência, uma das hipóteses de causa de exclusão da antijuridicidade, devendo-se atentar que, nessa fase, vigora o princípio do in dubio pro societate, não podendo o delegado de polícia embrenhar-se em questões doutrinárias de alta indagação, sob pena de antecipar indevidamente a fase judicial de apreciação de provas; permanecendo a dúvida ou diante de fatos aparentemente criminosos, deverá ser formalizada a prisão em flagrante.” (CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, p. 323).

Prisão em flagrante ilegal: caso a autoridade competente para a lavratura do auto de prisão em flagrante constate que a prisão foi ilegal, deixará de lavrar o auto. Isso não impede, no entanto, que aquele que teve a prisão “relaxada” não venha a responder pelo crime ou contravenção praticada, tampouco impede a decretação de sua prisão cautelar. Vejamos o seguinte exemplo: semanas após um homicídio, policiais efetuam a prisão, supostamente em flagrante, do acusado pelo crime, não estando a situação prevista em qualquer das hipóteses do art. 302 do CPP. Evidentemente, a prisão em flagrante foi ilegal, e o auto não poderá ser lavrado. Isso não impede, contudo, que o juiz decrete a prisão preventiva ou temporária do acusado, tampouco que o Ministério Público ofereça denúncia em seu desfavor, pela prática do homicídio.

Violação de domicílio: “Tratando-se, como nos autos, de crime permanente, não há se falar em ilegalidade da prisão em flagrante por violação de domicílio, uma vez que a Constituição Federal, em seu art. , inciso XI, autoriza a entrada da autoridade policial, seja durante o dia, seja durante anoite, independente da expedição de mandado judicial. 5. Ordem de habeas corpus parcialmente prejudicada e, no mais, não conhecida.” (STJ, RHC 32564 / SP, Relatora Ministra LAURITA VAZ, j. 22/10/2013).

Autoridade competente: o termo “competente”, no art. 304, deve ser interpretado em sentido amplo, como atribuição que determinada autoridade possui, em razão do cargo, de praticar os atos descritos no dispositivo. É o caso do delegado de polícia. Digo em sentido amplo porque, em verdade, competência tem a ver com jurisdição, exercida por juiz, e por mais ninguém. A incompetência do juiz é causa de nulidade de processo (art. 564I do CPP). Quanto ao delegado, como ele não exerce jurisdição, não é possível falar em incompetência. Há, no entanto, nas polícias, a divisão administrativa de sua estrutura (e. G., “delegacia de homicídios”, “delegacia de crimes contra o patrimônio” etc.), ficando o delegado responsável pelos casos de sua seção. Contudo, caso a prisão em flagrante seja autuada em delegacia diversa daquela onde deveria ter ocorrido (com base em divisão administrativa), não há que se falar em nulidade ou ilegalidade da prisão, tampouco em incompetência, que, como já dito, é coisa inerente à jurisdição.

Inexistência de autoridade competente no lugar da prisão: "demonstrando, mais uma vez, que a prisão pode ocorrer em lugar distante, não somente do local do crime, mas também em área onde não há autoridade competente para lavrar o auto, permite-se a ocorrência da detenção, devendo o condutor encaminhar, imediatamente à cidade mais próxima, onde há a autoridade, para que a prisão seja formalizada e expedida, no prazo de 24 horas, a nota de culpa (art. 306parágrafo 2oCPP)." (NUCCI, Guilherme de Souza. CPP Comentado, p. 646).

Local diverso: "A lavratura do auto de prisão em flagrante realizado em local diverso daquele onde foi efetuada a prisão não acarreta nulidade, porquanto a autoridade policial não exerce função jurisdicional, mas tão somente administrativa, inexistindo, dessa forma, razão para se falar em incompetência ratione loci (Precedentes)." (STJ, HC 30.236-RJ, Min. Rel. Felix Fischer, j. 17.02.2004).

Autoridade competente como condutora: “Quando a infração penal é cometida contra a autoridade competente para a lavratura do auto de prisão em flagrante, ou em sua presença, estando ela no exercício de suas funções, a própria autoridade pode figurar como condutora. Essa permissão somente se refere às pessoas que podem presidir inquéritos ou ações penais (autoridade policial e juiz), e não à qualquer autoridade, mesmo sendo ela presidente de comissão parlamentar de inquérito.” (BRASILEIRO, Renato. Curso de Processo Penal, p. 884).

Testemunhas para a lavratura do auto de prisão em flagrante: como o art. 304 fala em “testemunhas”, no plural, há o entendimento de que devem ser, no mínimo, duas. Nada impede que policiais funcionem como testemunhas. Se houver apenas uma testemunha, pode, o próprio condutor, ser considerado como segunda testemunha, desde que tenha presenciado o fato. Ademais, a falta de testemunhas da infração não impede a lavratura do auto de prisão em flagrante. Todavia, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade (art. 304, parágrafo segundo). São as intituladas “testemunhas fedatárias” ou “testemunhas instrumentárias”, que depõem sobre a regularidade de um ato, ou seja, são as testemunhas que confirmam a autenticidade de um ato realizado. Depõem, portanto, sobre a regularidade de atos que presenciaram, não sobre os fatos que constituem o objeto principal do julgamento.

Testemunha que não pode ou não sabe assinar: aplica-se o art. 216 do CPP, por analogia: “O depoimento da testemunha será reduzido a termo, assinado por ela, pelo juiz e pelas partes. Se a testemunha não souber assinar, ou não puder fazê-lo, pedirá a alguém que o faça por ela, depois de lido na presença de ambos.”.

Direito a manter-se em silêncio: “É ilícita a gravação de conversa informal entre os policiais e o conduzido ocorrida quando da lavratura do auto de prisão em flagrante, se não houver prévia comunicação do direito de permanecer em silêncio.” (STJ, HC 244.977-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 25/9/2012).

Ônus do conduzido: "Para que se configure o defeito no auto de prisão em flagrante pela omissão da autoridade policial em advertir o preso da faculdade de exercício de seus direitos constitucionais é necessário que tal circunstância seja adequadamente demonstrada." (STJ, HC 8.690-GO, Rel. Min. Vicente Leal, j. 18.05.1999).

Preso que não compreende a língua portuguesa: deve ser nomeado intérprete, nos termos dos arts. 193, sob pena de ilegalidade da prisão em flagrante.

Conduzido que se recusa, não sabe ou não pode assinar: o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas (“testemunhas instrumentárias”), que tenham ouvido sua leitura na presença do preso.

Art. 405§ 1o do CPP: perfeitamente aplicável ao auto de prisão em flagrante. Vejamos o que diz o dispositivo: “Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações.”.

Comunicação à família: segundo a CF, em seu art. 5oLXII, “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”. A redação é repetida no art. 306 do CPP. O não atendimento à determinação pode ensejar o relaxamento da prisão em flagrante.

Comunicação ao juiz e ao Ministério Público: o art. 306 determina que a prisão deve ser imediatamente comunicada ao juiz competente e ao Ministério Público (vide art. 5oLXII da CF). Imediato é o que não comporta espaço de tempo – se o legislador quisesse estipular prazo, teria feito, no “caput”, o que fez no art. 306, parágrafo primeiro, que fala em “24 (vinte e quatro) horas”. Portanto, no momento da apresentação do preso, a autoridade competente deve providenciar a comunicação imediata do juiz e do MP, e, dentro do prazo de vinte e quatro horas, contado da prisão, deverá encaminhar ao juiz o respectivo APF, bem como à Defensoria Pública, na hipótese da parte final do parágrafo primeiro. Na prática, no entanto, isso não ocorre. Geralmente, a comunicação da prisão ocorre no momento em que o APF é encaminhado ao juiz, dentro do prazo de vinte e quatro horas.

Comunicação à Defensoria Pública: para evitar ilegalidades, é essencial que o preso tenha a oportunidade de discutir judicialmente a sua prisão. Por isso, caso não indique advogado (ou não esteja acompanhado por um), deverá a autoridade competente encaminhar, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contado da prisão, cópia integral do auto de prisão em flagrante à Defensoria Pública (art. 306, parágrafo primeiro), para que adote as medidas cabíveis.

Presença de advogado [1]: não é imprescindível para a lavratura do auto de prisão em flagrante. Por isso, a ausência de defensor não gera qualquer ilegalidade.

Presença de advogado [2]: “Não é possível o relaxamento de prisão sob a alegação de nulidade do auto de prisão em flagrante quando o réu, no momento da lavratura do auto, não estava assistido por advogado, mas foi comunicado, pela autoridade policial, dos direitos previstos no art. CF de 1988, em especial o de receber assistência de familiares ou do advogado que indicar. Isso porque a documentação do flagrante prescinde da presença do defensor técnico do conduzido, sendo suficiente a lembrança, pela autoridade policial, dos direitos constitucionais do preso de ser assistido. Ademais, tratando-se de ato de natureza inquisitorial, não constitui formalidade essencial à validade do auto de prisão em flagrante a presença do advogado durante o interrogatório, impondo-se tão somente que se observem as regras pertinentes ao interrogatório judicial, inscritas nos artigos 185 a 195 do CPP.” (STJ, RHC 39284 / SP, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, j. 19/09/2013).

Nota de culpa: é um documento entregue ao preso, mediante recibo, onde constam o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas. Como já comentado acima, o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial (art. 5oLXIV da CF). Por isso, a nota de culpa é imprescindível. Ademais, é essencial que o preso tenha plena ciência do motivo que ensejou a sua prisão. Segundo o art. 306, parágrafo segundo, a nota de culpa deve ser entregue ao preso no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, após a realização da prisão, e, caso isso não ocorra, poderá a prisão em flagrante ser considerada ilegal.

Crimes de menor potencial ofensivo: é comum ouvir que, em crimes de menor potencial ofensivo (veja o conceito no art. 61 da Lei 9.099/95), não é possível a lavratura do auto de prisão em flagrante. Contudo, a assertiva não é verdadeira. Vejamos a redação do art. 69, parágrafo único: “Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança.”. Perceba que o dispositivo traz duas condições, alternativas, para que o auto não seja lavrado: a) encaminhamento imediato do autor do fato ao juizado; b) não sendo possível a primeira hipótese, deve o autor do fato assumir o compromisso de a ele comparecer. Quando não atendidas, deve ser lavrado o APF.

Lei de Drogas [1]: é vedada a prisão em flagrante daquele que é surpreendido em uma das hipóteses do art. 28 da Lei 11.343/06. Sobre o tema, vejamos a transcrição do art. 48, parágrafo segundo, do mesmo texto: “Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários”.

Lei de Drogas [2]: “Art. 50. Ocorrendo prisão em flagrante, a autoridade de polícia judiciária fará, imediatamente, comunicação ao juiz competente, remetendo-lhe cópia do auto lavrado, do qual será dada vista ao órgão do Ministério Público, em 24 (vinte e quatro) horas. § 1o Para efeito da lavratura do auto de prisão em flagrante e estabelecimento da materialidade do delito, é suficiente o laudo de constatação da natureza e quantidade da droga, firmado por perito oficial ou, na falta deste, por pessoa idônea.”. Nota: o art. 50 da Lei 11.343/06 não afasta a aplicação dos arts. 301/310 do CPP.

Inquérito policial: o auto de prisão em flagrante é peça hábil a iniciar o inquérito policial, em substituição à portaria.

Menor infrator: só comete crime ou contravenção penal quem já atingiu a maioridade penal (art. 288 da CF). Antes disso, fala-se em ato infracional, que nada mais é do que a conduta descrita como crime ou contravenção penal praticada por quem ainda não alcançou os dezoito anos de idade. O adolescente infrator, encontrado em situação de flagrante (nos termos do art. 302 do CPP), deve ser apreendido, e não preso. Pode parecer mero eufemismo, mas, em verdade, a prisão em flagrante e a apreensão em flagrante são procedimentos completamente diversos. A apreensão é regulada pelo ECA (Lei 8.069/90), nos artigos 172/181, enquanto a prisão em flagrante está prevista nos arts. 302/310 do CPP. Vejamos algumas particularidades do procedimento do ECA: a) se o ato infracional for praticado mediante violência ou grave ameaça, deverá a autoridade policial lavrar o auto de apreensão em flagrante (art. 173I do ECA). Caso contrário, a lavratura do auto poderá ser substituída por boletim de ocorrência circunstanciada (art. 173, parágrafo único); b) o adolescente apreendido não pode ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial (art. 178); c) comparecendo qualquer dos pais ou responsável, o adolescente apreendido poderá ser liberado pela autoridade policial; d) é possível a remissão do apreendido pelo ato praticado (art. 180, II). E se o adolescente for apreendido por ato praticado em concurso com maior de idade, qual procedimento deve ser adotado? A resposta está no art. 172parágrafo único do ECA: “(...) em se tratando de ato infracional praticado em co-autoria com maior, prevalecerá a atribuição da repartição especializada, que, após as providências necessárias e conforme o caso, encaminhará o adulto à repartição policial própria.”.

Soltura do preso: lavrado o auto de prisão em flagrante, deve a autoridade policial determinar o encarceramento do preso (ato vinculado), salvo se a sua soltura for imposta pela legislação. A primeira hipótese de soltura é a da prisão ilegal. Segundo a CF, “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”. Apesar de o texto falar em “autoridade judiciária” - ou seja, o juiz -, muitos autores entendem que a prisão em flagrante pode ser relaxada pela autoridade policial, caso seja ilegal. Contudo, o raciocínio não é correto, e explico a razão: como já comentado, a prisão em flagrante é ato complexo, composto por vários atos, que só se completa com a lavratura do respectivo auto. Caso o delegado constate que a voz de prisão e o encaminhamento do preso à sua presença foram ilegais, deixará de lavrar o auto de prisão em flagrante – o que, como consequência lógica, fará com que o preso seja solto, pois o flagrante será tido como inexistente. O preso poderá, simplesmente, levantar-se e sair do local em que se encontre, caso não exista outra razão que o impeça, pois não será mais considerado preso (na prisão relaxada pelo juiz, o preso só será solto mediante alvará). Portanto, não é hipótese de relaxamento da prisão, mas de não ratificação dos atos praticados anteriormente à entrega do preso à autoridade policial - a captura e o encaminhamento. Muitos, no entanto, discordam, e entendem que se trata de relaxamento. Outra hipótese de soltura é a concessão, pela autoridade policial, de liberdade provisória mediante fiança, nos seguintes termos: “Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.”. Na hipótese de liberdade provisória mediante fiança, estarão presentes todos os atos anteriores: a captura, a condução coercitiva e a lavratura do APF. Contudo, ao final, em vez de determinar o recolhimento do preso, a autoridade policial arbitrará fiança (veja os valores no art. 325), que, se paga, garantirá a soltura do preso, sem a necessidade de expedição de alvará, pelo juiz. Caso não seja paga, a colocação em liberdade passará a depender de concessão judicial.

Remessa do APF ao juiz: de acordo com o art. 310, ao receber o APF, dentro do prazo de 24 (vinte e quatro) horas, o juiz deverá: a) analisar a legalidade da prisão: com base no art. 302 do CPP, é possível identificar se a prisão em flagrante foi ou não legal. Reconhecida a ilegalidade, a prisão é relaxada e expede-se alvará de soltura em favor do preso; b) conceder a liberdade provisória: reconhecida a legalidade da prisão, deve o juiz analisar se os requisitos da prisão preventiva (arts. 312 e 313) estão presentes. Caso a constatação seja negativa, o preso deverá ser colocado imediatamente em liberdade – também é necessária a expedição de alvará de soltura. Caso o crime seja afiançável (vide arts. 323 e 324), o juiz deverá conceder a liberdade provisória mediante fiança; c) determinar a manutenção da prisão: dentro do prazo de vinte e quatro horas, a autoridade competente deverá realizar todos os atos que compõem a lavratura do APF, que tem como termo final a remessa dos autos ao juiz. Somente durante esse prazo alguém poderá permanecer preso em razão de prisão em flagrante. Após o seu término, a prisão só poderá ser mantida se decretada a prisão preventiva, caso contrário, o preso deverá ser colocado imediatamente em liberdade. Os requisitos da prisão preventiva estão nos arts. 312/313 do CPP. Quando ausentes, impõe-se a concessão de liberdade provisória (vide item b). Quando presentes, o juiz, evidentemente, deve decretá-la. No relaxamento e na concessão de liberdade provisória, expede-se alvará de soltura em favor do preso – geralmente, o alvará é cumprido por oficial de justiça, mas nada impede que seja remetido diretamente à autoridade que detém a custódia do preso. Por outro lado, caso o juiz decrete a prisão preventiva, expedir-se-á mandado de prisão contra quem foi preso em flagrante. Mas, se a pessoa já está presa, em virtude do flagrante, é possível cumprir mandado de prisão em seu desfavor? Sim. Por mais que a pessoa já esteja presa, ser-lhe-á dada voz de prisão, oportunidade em que será comunicada a respeito da decisão que manteve a sua prisão.

Manutenção da prisão: “Como já analisado, a partir da nova redação do art. 310, em seu inciso II, a prisão em flagrante, ao que parece, perdeu seu caráter de prisão provisória. Ninguém mais responde a um processo criminal por estar preso em flagrante. Ou o juiz converte o flagrante em preventiva, ou concede a liberdade (provisória ou por relaxamento em decorrência de vício formal). A prisão em flagrante, portanto, mais se assemelha a uma detenção cautelar provisória pelo prazo máximo de vinte e quatro horas, até que a autoridade judicial decida pela sua transformação em prisão preventiva ou não.” (CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, p. 327).

Excesso de prazo [1]: “Não é possível o relaxamento de prisão sob a alegação de nulidade do auto quando a defesa sustenta a demora na comunicação do flagrante ao juiz, mas não junta documentação suficiente para comprovar tal alegação. Isso porque, de acordo com entendimento do tribunal de origem, o qual está em consonância com o do STJ, eventual demora na comunicação do flagrante ao juiz não tem o condão de nulificar o processo, por constituir mera irregularidade, sobretudo quando se trata de pequeno atraso, tido como razoável, como consignado no acórdão impugnado.” (STJ, RHC 39284 / SP, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, j. 19/09/2013).

Excesso de prazo [2]: “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a demora de prazo superior a 24h para apreciar a conversão da prisão em flagrante em preventiva, pelo Juízo de primeiro grau, consiste em mera irregularidade procedimental, a qual não enseja o relaxamento da prisão cautelar, mormente se considerada a superveniência de decisão na qual está devidamente apontada a presença dos requisitos para a custódia cautelar previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.” (STJ, HC 259068 / RJ, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, j. 09/04/2013).

Excesso de prazo [3]: “1. Convertida a prisão em flagrante em preventiva, por meio de decreto no qual se demonstrou, in concreto, a necessidade da segregação cautelar para garantia da ordem pública, resta superada eventual irregularidade decorrente de alegado excesso de prazo na realização da providência prevista no art. 310 do Código de Processo Penal. 2. Recurso ordinário desprovido.” (STJ, RHC 39691 / MG, Relatora Ministra LAURITA VAZ, j. 12/11/2013).

Excesso de prazo [4]: "Tratando-se de prisão, ato constritivo de cerceamento da liberdade, não se deve admitir concessões, razão pela qual a remessa da cópia do auto de prisão em flagrante ao magistrado competente, ao Ministério Público e, quando for o caso, à Defensoria Pública deve ocorrer, impreterivelmente, em 24 horas, contadas a partir do momento da prisão - e não do término da lavratura do auto de prisão em flagrante" (NUCCI, Guilherme de Souza. CPP Comentado, p. 644).

Superação da ilegalidade: “Decretada a prisão preventiva, fica superada eventual ilegalidade do flagrante, principalmente como no caso, em que já foi proferida até sentença condenatória, em que se negou ao acusado o direito de recorrer em liberdade. Não há falar, portanto, em relaxamento do flagrante ao argumento de que a situação do acusado não se enquadraria nas hipóteses previstas no art. 302 do Código de Processo Penal. Precedentes.” (STJ, HC 231118 / TO, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, j. 17/10/2013).

Fundamentação insuficiente: “Na hipótese, constata-se o constrangimento ilegal, na medida em que a prisão em flagrante do paciente foi convertida em preventiva e mantida, para garantia da ordem pública, sem que se apontasse qualquer fato concreto, que demonstrasse, de maneira fundamentada e idônea, a necessidade da custódia, para garantia da ordem pública, o que, de acordo com a jurisprudência do STJ, não se admite.” (STJ, HC 267356 / MA, Relatora Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, j. 22/10/2013). Nota: as medidas cautelares diversas da prisão estão previstas no art. 319 do CPP.

Medidas cautelares diversas da prisão: “1. O Juízo processante, ao receber o auto de prisão em flagrante, verificando sua legalidade e inviabilidade de sua substituição por medida diversa, deverá convertê-la em preventiva, quando reconhecer a existência dos requisitos preconizados nos arts. 312 e 313, do CPP, independente de representação ou requerimento. 2. A necessidade da segregação cautelar se encontra fundamentada na garantia da ordem pública em face da periculosidade do recorrente, caracterizada pela reiteração de prática delituosa. 3. O Superior Tribunal de Justiça, em orientação uníssona, entende que persistindo os requisitos autorizadores da segregação cautelar (art. 312CPP), é despiciendo o recorrente possuir condições pessoais favoráveis. 4. Recurso em "habeas corpus" a que se nega provimento.” (STJ, RHC 41235 / MG, Relator Ministro MOURA RIBEIRO, j. 07/11/2013).

Liberdade provisória, relaxamento da prisão em flagrante e o Exame de Ordem: não faz muito tempo, a FGV pediu, na segunda fase, a elaboração de um pedido de relaxamento da prisão em flagrante. Por isso, pensando em quem está se preparando para a prova, decidi incluir este tópico ao nosso material. Em primeiro lugar, é preciso ter em mente: se o problema trouxer um caso em que o cliente foi preso em flagrante, o seu objetivo será apenas um: conseguir com que ele seja solto. Qualquer outra questão deverá ser deixada de lado. Por ora, empreenda todos os esforços para que o acusado seja solto. E como isso é possível? Inicialmente, procure “ganchos” no enunciado que apontem a ilegalidade da prisão (ex.: a família não foi comunicada). Leia o enunciado uma, duas, três ou mais vezes, até que todos os “ganchos” sejam detectados. Caso encontre alguma ilegalidade, faça o pedido de relaxamento da prisão em flagrante, endereçado ao juiz (veja o modelo em nosso “manual de prática”). Portanto, o pedido de relaxamento é a peça cabível quando a prisão em flagrante for ilegal. E se não houver ilegalidade alguma? Se a prisão for legal, então a peça cabível será o pedido de concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança (modelo também disponível no “manual”), com a alegação de que os requisitos da prisão preventiva não estão presentes (provavelmente, o enunciado dirá que o preso possui residência fixa, trabalha etc.). Logo, podemos concluir o seguinte: a) se a prisão for ilegal, o pedido será o de relaxamento da prisão, endereçado ao juiz, com a tese de prisão ilegal; b) se a prisão for legal, o pedido será o de concessão de liberdade provisória, endereçado ao juiz, com a tese de ausência dos requisitos da prisão preventiva (veja arts. 312/313). Em ambos os casos, o pedido será o mesmo: a expedição de alvará de soltura. Por fim, uma questão: é possível cumular os pedidos de relaxamento e de liberdade provisória? Sim! Principalmente, em casos reais, em que o advogado usa tudo ao seu alcance para conseguir a liberdade do acusado. Pede-se o relaxamento em preliminar, pois a alegação é de ilegalidade da prisão, e, subsidiariamente, a concessão de liberdade provisória, caso o juiz entenda pela legalidade da prisão.

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