Embora atualmente mitigada, a
culpa, com certeza, ainda possui importância e consequências para o cônjuge que
infringiu um dos deveres do casamento:
Primeiramente, entende-se
que culpa é a violação de um dos deveres conjugais estabelecidos na
lei; pouco importa o motivo da violação:
Art. 1.566. São deveres de ambos
os cônjuges:
I – fidelidade recíproca;
II – vida em comum, no domicílio
conjugal (dever de coabitação e débito conjugal);
III – mútua assistência;
IV – sustento, guarda e educação
dos filhos;
V – respeito e consideração
mútuos.
O culpado não tem direito a
alimentos, exceto se precisar de alimentos humanitários e mesmo assim
tem o ônus da prova dessa necessidade (art. 1.694, §2º e parágrafo único do
art. 1.704). Não possui, portanto, direito a alimentos civis (aqueles
mais desejados, pois servem para manter a condição social usufruída pelo
cônjuge durante a sociedade conjugal). Diante desse cenário, embora o divórcio
seja um direito potestativo incondicionado, pode ser de interesse do cônjuge
proponente da ação de divórcio litigioso demonstrar que o rompimento da relação
decorreu de culpa do Réu. Este, por sua vez, se a causa de pedir contiver
imputação de culpa, deverá se defender para comprovar que não foi o culpado, o
que lhe permitirá escapar de uma condenação de pagar alimentos civis.
OBS: lado outro, o Réu, se não
existir na petição inicial menção a culpa do Réu, ainda assim ele poderá, em
sede Reconvenção (ver art. 343, CPC), alegar culpa do cônjuge autor,
pois, se comprovada, ficará isento de, futuramente, ser demandado para prover
alimentos ao ex-cônjuge (alimentos pós-divórcio).
OBS: a legalidade de alimentos
pós-divórcio é questionável, pois, extinta a sociedade conjugal, desfazem-se
todos os vínculos que havia entre os cônjuges. Todavia, uma parcela minoritária
da doutrina defende que o meta-jurídico dever de solidariedade permanece mesmo
depois do divórcio, com base no princípio da solidariedade familiar e da
dignidade humana, os quais, todavia, esbarram na regra da legalidade prevista
na Constituição: “art. 5º – II: ninguém será obrigado a fazer
ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”
O culpado não tem direito de
manter o sobrenome do ex-cônjuge, exceto se provar que a retirada do sobrenome
lhe trará prejuízos; tem ele o ônus da prova dessa alegação:
Art. 1.578. O cônjuge declarado
culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do
outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se
a alteração não acarretar:
I – evidente prejuízo para a sua
identificação;
II – manifesta distinção entre o
seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida;
III – dano grave reconhecido na
decisão judicial.
O culpado pela separação de fato
não participa da sucessão do outro (ver art. 1.830). Interessante hipótese de
discussão de culpa em separação de fato.
Aquele que abandona o lar
descumpre o dever de coabitação. Este ato culposo pode acarretar a aquisição de
propriedade (apenas da meação pertencente ao outro) pelo inocente (Lei nº.
12.424/2011: Usucapião de Direito de Família):
Art. 1.240-A. Aquele que
exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com
exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros
quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que
abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família,
adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro
imóvel urbano ou rural. (Incluído
pela Lei nº 12.424, de 2011)
§ 1 o O direito
previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma
vez.
OBS: note-se que esse dispositivo
somente se aplica àquela situação em que o bem imóvel pertencia aos dois
cônjuges em regime de comunhão.
A culpa NÃO tem importância no
que tange à guarda dos filhos (confira o art. 1.584 CCB), haja vista a
revogação, elo CCB/2002, do art. 5º e art. 10 da Lei do Divórcio, dispositivos
que prescreviam o seguinte: “Art. 5º – A separação judicial pode ser
pedida por um só dos cônjuges quando imputar ao outro conduta desonrosa ou
qualquer ato que importe em grave violação dos deveres do casamento e tornem
insuportável a vida em comum. Art. 10 – Na separação judicial fundada no ”
caput ” do art. 5º, os filhos menores ficarão com o cônjuge que a
ela não houver dado causa.”
Antes da EC 66/2010, se a ação de
divórcio/separação fosse proposta tendo causa de pedir a culpa do
Requerido, cabia ao autor da ação a prova dessa alegação, sob pena de
improcedência do pedido. Entendo que hoje esse posicionamento não mais se
sustenta, haja vista que a faculdade de se divorciar é um direito potestativo
incondicionado. Por tal motivo, proposta a ação com base na culpa do Réu, deve
ser decretado o desfazimento do vínculo matrimonial, ainda que não demonstrada
a violação de dever do casamento por parte ele. Naturalmente, nesta situação, o
Réu não sofrerá nenhum dos efeitos da culpa.
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